sexta-feira, 1 de julho de 2016

Camadas ou a influência da perfeição

As pessoas são como as cebolas, cheias de camadas. Onde é que já ouvi isto? A verdade é que são mesmo. É que somos mesmo. Dentro de um mesmo papel; mãe, tia, prima, filha, amiga ou empregada, somos feitas de partes que variam elas também consoante o momento. Eu não sou a mesma que era o ano passado e certamente não serei a mesma daqui a mais um ano. Mesmo que certas mudanças sejam imperceptíveis, certamente mais para quem só vê, ou quer ver, um lado, uma camada.  
Olho para as minhas filhas que mudam e que são seres maravilhosos cheios de camadas, que vou tentando conhecer aos poucos, e deslumbro-me com a luz que emanam. Com o amor que deitam à sua volta, com a generosidade que partilham, com a ternura que nos retribuem o quanto as amamos. Mas também vivo com as birras, com as dores, com as perguntas difíceis e inconvenientes, com os pedidos insistentes e exigências de atenção, com as noites que se dorme pouco, com o cansaço de acordar ainda não são 7 da manhã e ter que começar a ler histórias naquele momento, com os chichis feitos pelas pernas abaixo ou os gritos para mudar fraldas. E se esse lado não aparece em fotografias tão frequentemente, ou quase nunca, não é pela sua ausência, é simplesmente porque para não ficar doida eu escolho focar a lente no bom. Sim, sou eu que escolho onde concentrar a minha atenção, onde agarrar a luz e o que reviver. Porque é mesmo assim, há sempre luz e sombra. Amor e dor. Não conheço ninguém que nunca tenha chorado. 
Faz sentido? 
Neste mundo onde vemos tanta imagem bonita, tanta mulher (aparentemente) perfeita, tanta mãe que nunca se cansa de mudar de camada à velocidade da luz, tantas casas fantasticamente despovoadas de tralha e tantas crianças sem nódoas, é difícil não sentirmos que andamos a falhar em algum lado. Seja os quilos a mais (hum.. hum...), os brinquedos no chão da sala que lá estão há dois dias (hum.. hum) ou um jantar de coisas mal amanhadas que são as poucas que temos no frigorífico, tudo nos faz sentir que podíamos fazer melhor. Eu sou, assumidamente, essa mulher, a que sente que falha quando o jantar não é composto por três pratos. Estou a trabalhar nisto. Não porque três pratos está errado mas porque não é a escolha certa para mim. 
E depois de escrever este texto enorme percebi que o tinha feito somente porque precisava de atestar para o mundo que o que se partilha é uma parte, nunca a totalidade e que reviver o bom não é burrice mas sim uma opção. Uma que muitas vezes nos previne de ficar loucas e que nos ajuda a continuarmos a amar e a dar mais e melhor. 

E agora momentos perfeitos num dia imperfeito. ;-) 

 A lavanda e os mirtilos.


 A Sara, o Zacarias Pé Descalço, as margaridas e os dióspiros a crescer.
 A Sara, a pausa.


7 comentários:

  1. Como me revejo nas tuas palavras... Mas não te preocupes com as mães que mostram casas sem brinquedos espalhados ou que se mostram lindas com boas unhas e bons penteados, pois essas têm empregadas que fazem por elas muito daquilo com que lutamos todos os dias. É incrível como muitas bloguers dão workshops de como lidam com o tempo e etc. quando o tempo delas tem menos horas que o nosso, digamos assim. Se somos melhores mães porque parecemos gatas borralheiras? Nada disso, mas confesso que gosto de ter lama na cara se for reflexo da brincadeira dos meus filhos 😘

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    1. O que me preocupa é o todo, o ser melhor mãe ao mesmo tempo que mulher, amiga, filha... E os outros serão sempre uma pressão quer sejamos menos ou mais susceptíveis a isso. Não queria era deixar de mostrar que por aqui também se pena porque eu também sou "culpada" das partilhas bonitas. Partilhas que faço do melhor que a minha vida tem mas que não são representativas do todo que é a minha vida. Um beijinho para ti que nada tens de gata borralheira ;-) <3

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  2. Como te entendendo e me revejo! Obrigada pela partilha!

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  3. Que texto lindo Patrícia, tão bem escrito! E como me identifico!

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  4. ... "não é burrice mas sim opção!" - Como é difícil explicar isto. Adorei o texto.

    Bjs grandes

    PS - E vivam as cebolas com as suas camadas - uso esta expressão tantas vezes cá em casa :p

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Escrevam-me de volta. Gosto de saber que não estou a "falar" sozinha.... :-)